quarta-feira, 13 de abril de 2011

H. P. Lovecraft


Entonces. O Lovecraft é um autor consagrado no ramo do terror. Suas histórias não figuram entre aquele tipo de terror escrachado e despropositado. Sua obra, quase sempre sob forma de conto, se apresenta de uma maneira ricamente subsidiada por conceitos e relações com a ciência humana. Suas histórias não têm apenas o objetivo de aterrorizar, mas também levam à uma séria reflexão sobre suas teorias alucinantes, ensaiando, quase sempre, dar uma explicação lógica à acontecimentos 'sobrenaturais'. Nunca, contudo, o autor exlcui o elemento maléfico e sombrio.
Como ele tem muitos contos, e eu certamente não li todos - ainda -, não vou postar da forma que geralmente posto. Vou indicar os títulos que considerei entre os melhores, com algumas passagens à pretexto de conhecimento do clima e ritmo dos escritos. Aqui vai:

>> A coisa no umbral, 1933 - pra mim, com certeza o melhor, dos que li;
>> Nas montanhas da loucura, 1931;
>> Os sonhos na casa da bruxa, 1932;
>> A casa abandonada, 1924;

...
 
Não éramos, como já disse, de maneira alguma infantilmente supersticiosos, mas o estudo científico e a reflexão nos haviam ensinado que o universo conhecido de três dimensões abarca uma fração ínfima de todo o cosmos de substância e energia. Naquela casa, um grande número de indícios, proveniente de numerosas fontes autênticas, apontava para a existência tenaz de certas forças de grande poder e, no que tange ao ponto de vista humano, excepcional malignidade. Declarar que verdadeiramente acreditávamos em vampiros ou lobisomens seria uma assertiva levianamente genérica. Mais correto seria dizer que não estávamos dispostos a negar a possibilidade de certas modificações desconhecidas e ainda não classificadas de força vital e matéria atenuada. Tais modificações se dariam com certa raridade no espaço tridimensional devido à ligação mais estreita desse espaço com outras unidades espaciais, mas ocorreriam suficientemente perto da fronteira de nosso espaço para nos proporcionar manifestações ocasionais que, por falta de um adequado ponto de observação, talvez nunca possamos vir a compreender.
Em suma, julgávamos, meu tio e eu, que um conjunto incontroverso de fatos apontavam para alguma influência persistente na casa abandonada. Essa influência podia ser atribuída a um ou outro dos rudes colonos franceses de dois séculos passados e ainda atuava através de leis desconhecidas de movimento atômico e eletrônico. O registro da história da família de Roulet parecia comprovar que ela possuíra uma afinidade anormal com círculos externos de entidade – domínios sombrios pelos quais a gente normal sente apenas repulsa e terror. Não seria de imaginar, então, que as rixas daqueles anos remotos da década de 1730 houvessem acionado algumas forças cinéticas no cérebro mórbido de um ou mais deles – principalmente no do sinistro Paul Roulet – que obscuramente haviam sobrevivido aos corpos assassinados e haviam continuado a atuar em algum espaço multidimensional segundo as linhas originais de força determinadas por um ódio desvairado contra a comunidade invasora?
Tal fato não constituía decerto uma impossibilidade física ou bioquímica à luz de uma nova ciência que inclui as teorias da relatividade e da ação intra-atômica. Podia-se facilmente imaginar um núcleo alienígena de substância ou energia, informe ou não, conservado vivo por meio de subtrações imperceptíveis ou imateriais da força vital ou dos tecidos e fluidos corporais de outros seres vivos, mais palpavelmente vivos, nos quais ele penetra e com cuja trama às vezes se funde completamente. Ele poderia ser ativamente hostil ou poderia obedecer tão-somente às cegas motivações da autoconservação. Em todo caso, tal monstro seria necessariamente, em nossa ordem de coisas, uma anomalia e uma intrusão, cuja extirpação constitui dever primacial de todo homem que não seja inimigo da vida, da saúde e da sanidade do mundo.

[A casa abandonada, 1924]

A escuridão estava sempre cheia de sons inexplicáveis; no entanto, ele às vezes tremia de medo de que os barulhos que ele escutava cessassem, permitindo-lhe ouvir outros sons mais leves que, suspeitava ele, escondiam-se por trás deles.
Ele sabia que seu quarto ficava na antiga Casa das bruxas – fora por isso mesmo, aliás, que ele o tomara. Havia muita coisa nos registros do Condado de Essex sobre o julgamento de Kaziah Mason; e o que ela admitira sob pressão diante da comissão especial para julgamentos criminais havia fascinado Gilman sobremaneira. Ela falara ao juiz Hathorne a respeito de linhas e curvas que podiam apontar para direções que conduziam, através dos limites do espaço, a outros espaços desconhecidos , e havia dado a entender que tais linhas e curvas eram empregadas com freqüência em certas reuniões, à meia-noite, no vale sombrio da pedra branca além de Meadow Hill e na ilha desabitada do rio. Depois ela havia desenhado aquelas coisas nas paredes de sua cela e desaparecido.

Azathoth, uma entidade destituída de mente, que governa o tempo e o espaço de seu trono negro no centro do caos.

[Os sonhos na casa da bruxa, 1932]

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