sábado, 20 de janeiro de 2018

Peripécias de Luíza Lopes. 14 de Dezembro de 2010.

            Aos 17 anos Karina ganhou uma irmã. Filha única até então, não haveria de poder conceber quão forte é o laço entre irmãos. Concebeu-o então, sentiu-o então. E chorou no hospital ao pegar aquela coisinha minúscula, com perninhas compridas e finas e cabeleira negra e generosa.
            Não imaginava, Karina, que com tanto amor, também viessem tantas dúvidas, principalmente no tocante à criação e desenvolvimento de uma criança. E não imaginava também, Karina, o quanto isso a preocuparia de forma latente.
          A pequena Luíza - que é como se chama a coisinha aquela do hospital – está às vésperas de completar 8 anos de idade. É uma pessoinha, pois, em construção, mas já uma pessoinha.
            Explica-me ao telefone, como estará ocupada no final de semana, que será cheio de festinhas de amiguinhas, e de passeios do colégio, e que por conta da agenda atribulada não poderá visitar a irmã mais velha, Karina. A irmã mais velha entende, mas não consegue deixar de sentir certa fisgada no peito, um certo despeito talvez, por ser preterida.
            Mas a despeito de qualquer despeito burro e mesquinho – inerente a todos os humanos – Karina sentiu algo mais. Percebeu de fato a pessoinha Luíza, construindo sua vidinha, suas relações, sua rede de contatos e experiências, e se viu, subitamente, relegada a um plano secundário.
            E isso é bom. Isso é incrivelmente bom. Karina se sente presenciando o construir de uma vida. E tudo bem que não é mais a heroína da irmã, tudo bem. Karina se sente feliz. É como se Luíza deixasse de habitar um único plano virtual, no qual ela é parte de algo, para desenvolver um plano só dela, feito por ela.
            Karina enruga a testa quando Luíza pede um cd do Justin Bieber e se vê numa encruzilhada. Não quer magoar a pequena com argumentos egoístas que a pobrezinha nem mesmo ainda pode articular. Não quer gastar o pouco tempo de que dispõe ao lado da irmã amada tentando convencê-la, numa teimosia inócua e tola, de que o Justin Bieber é um grande bobalhão. Ela não vai concordar. É Karina contra um arsenal televisivo e cultural gigantesco. O que acontecerá, sim, é aquele olhar triste, magoado, pidão e envergonhado. E causar isso é crueldade, das mais injustificadas!
            Karina lembra que em outros tempos já gostou do “É o tchan”, e se dá conta que isso não foi fator relevante na construção da sua personalidade adulta. Decide então por gravar os CDs. Gravados os CDs do Justin Bieber, – que, pasmem, já são dois – Karina os leva para Luíza, na expectativa de ver os olhinhos dela brilharem quando os vir. Inevitavelmente é o que ocorre. E os olhos de Karina também brilham ao ver a irmã tão feliz. E nada mais tem a ver com Justin Bieber, com cultura de massa, com má influência. Tem a ver unicamente com o amor fraterno e com o desejo sincero de felicidade do outro, no caso, da pequena Luíza.


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