quarta-feira, 28 de julho de 2010

Entrevista com o Vampiro - Anne Rice, 1976

Pois então. Finalmente consegui ler o livro mais famoso da Anne Rice. Não tem o que dizer. Simplesmente fantástico. E uma ressalva, o filme sem dúvida é uma das melhores adaptações literárias para a telona que eu já vi. Além de ser fiel ao texto, com pequenas alterações, mais no sentido de traduzir melhor para a linguagem do cinema, o filme captura muito bem a atmosfera do livro. Enfim, mais que indicados, livro e filme. Vergonha eu ainda não ter lido o livro =P.


RICE, Anne. Entrevista com o vampiro.7ª ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1992. 309 p.

Esta é uma idéia muito mais mundana. As pessoas que param de crer em Deus ou na bondade continuam a acreditar no diabo. Não sei por que. Não, realmente não sei por que. O mal é sempre possível. E a bondade é eternamente difícil. P. 20

Acho que é esta a função do monumento. Seja a pequena casa ou a mansão de colunas gregas ou ferro trabalhado. O monumento não diz que este ou aquele homem andou por ali. Não, mas que aquilo que sentiu em determinada época e em determinado local ainda continua. P. 45

- Mas por que... disse que Lestat não devia ter feito que começasse com pessoas. Quer dizer... que para você era uma opção estética, e não moral?
- Se tivesse me perguntado então, teria lhe dito que era estética, que pretendia compreender a morte por etapas. Que a morte de um animal me proporcionava tal prazer e experiência que mal tinha começado a compreendê-la, e desejava resguardar a experiência da morte humana para uma fase mais madura. Mas era moral. Por que na verdade, todas as decisões estéticas são morais.
- Não compreendo - disse o rapaz. – Pensava que a estética pudesse ser inteiramente amoral. O que diz do clichê do artista que abandona mulher e filhos para pintar? Ou Nero, tocando harpa enquanto Roma ardia?
- Ambas são atitudes morais. Ambas serviram a um bem maior, na mente do artista o conflito se estabelece entre a moral do artista e a sociedade, e não entre estética e moralidade. Mas freqüentemente isto não é compreendido. E aí surge o desperdício, a tragédia. Um artista, roubando quadros de uma loja, por exemplo, imagina ter tomado uma decisão inevitável mas imoral, e então se vê como um perseguido pelo destino. O que se segue é desespero e irresponsabilidade mesquinha, como se a moralidade fosse um imenso mundo de vidro que pudesse ser irremediavelmente maculado por um único ato. Mas, na época, esta mão era minha maior preocupação. Ainda não pensava nisso. Acreditava que só matava animais por razões estéticas, e me atinha à grande questão moral: se minha própria natureza era maldita ou não.
- Pois, compreende, apesar de Lestat nunca me dito nada sobre diabos ou infernos, acreditava estar condenado desde o momento em que me uni a ele, assim como Judas deve ter acreditado quando colocou um laço em torno do pescoço. Compreende? P. 73

- A grande aventura de nossas vidas. Qual o significado da morte quando se pode viver até o fim do mundo? E o que é “o fim do mundo”, além de uma frase, pois quem sabe, ao menos, o que é o mundo? Já vivi dois séculos, vi as ilusões de um serem transferidas para o outro, sendo eternamente jovem e eternamente velho, sem possuir ilusões, vivendo cada momento de um modo que me fazia pensar num relógio de prata tiquetaqueando no vazio: o painel pintado, os ponteiros delicadamente esculpidos por mãos jamais vistas por alguém, sem olhar para ninguém, iluminado por uma luz que não era luz, como aquela sob a qual Deus fez o mundo antes de criar a luz. Funcionando, funcionando, funcionando, com a precisão de um relógio, em uma sala tão vasta quanto o universo. P. 135

- Minha memória é nítida demais, aguçada demais. As coisas deviam ficar guardadas e o que não se resolvesse deveria se desvanescer. Mas as imagens ficam próximas de meu coração como retratos em medalhões, ainda que sejam retratados tão monstruosos que nenhum artista ou câmera jamais poderiam registrar [...]. P. 192

- Então não somos... – cheguei para a frente. - ...os filhos de Satã?
- Como poderíamos ser filhos de Satã? – perguntou. – Acredita que Satã criou este mundo que nos cerca?
- Não, creio que Deus o criou, se é que alguém o fez. Mas Ele também fez Satã, e quero saber se somos seus filhos!
- Exatamente. Se você acredita que Deus criou Satã, deve compreender que todos os poderes de Satã provêm de Deus, que Satã é simplesmente filho de Deus, e que nós também o somos. Na verdade não há filhos de Satã. P. 216

[...] Não há gradações de perversidade? Será o mal um imenso e perigoso poço onde se cai ao primeiro pecado, mergulhando até o fundo? P. 217

- Este mal, este conceito, ele nasce da decepção, da amargura. Vê? Filhos de Satã! Filhos de Deus! Esta é a única pergunta que me faz, este é o único poder que o obceca. Por que precisa nos transformar em deuses e diabos, quando o único poder que existe está dentro de nós mesmos? Como pode acreditar nessas mentiras fantásticas, nesses mitos, nessas caricaturas do sobrenatural? P. 220

[...] Para os vampiros, o amor físico culmina e se satisfaz em uma coisa: a morte. P. 234

[...] Quantos vampiros você pensa que têm condições para a imortalidade? Para começar, têm uma visão completamente distorcida de imortalidade. Ao se tornarem imortais, querem que todas as características de suas vidas permaneçam imutáveis: carruagens seguindo sempre a mesma moda, roupas com cortes a seu gosto, homens se comportando e falando do mundo que sempre compreenderam e apreciaram. Quando, na verdade, tudo muda, exceto o próprio vampiro. Tudo, a não ser o vampiro, está sujeito a corrupções e distorções constantes. Em pouco tempo, com uma mente inflexível, e geralmente mesmo para as mentalidades mais flexíveis, esta imortalidade torna-se uma sentença a ser cumprida num asilo de vultos e formas inexoravelmente incompreensíveis e sem valor. Numa noite o vampiro acorda e percebe aquilo que há décadas temia: que simplesmente não quer mais viver, a qualquer preço. O estilo, moda ou forma de existência que tornaram a imortalidade tão atraente foram varridos da face da terra. E não há mais nada para aliviar o desespero, a não ser o ato de matar. E este vampiro sai para morrer. Ninguém encontrará seus restos. Ninguém saberá para onde foi. E geralmente ninguém a sua volta – pudesse ele ainda procurar a companhia de outros vampiros – ninguém saberá que ele está desesperado. Há muito tempo terá parado de falar de si mesmo ou de qualquer outra coisa. Ele desaparecerá. P. 259 – 260

- Costumava acreditar que superaria isto. Que quando a dor por tudo que aconteceu o deixasse, voltaria a ter calor e se encheria de amor, e se encheria daquela curiosidade feroz e insaciável que demonstrou em nosso primeiro encontro, aquela consciência inveterada e aquela sede de saber que o levou à Paris e à minha cela. Pensei que fizessem parte de você e não pudessem morrer. [...] E acreditei que o atrairia e o prenderia a mim. E teríamos muito tempo, seríamos professor um do outro. Todas as coisas que lhe trouxessem felicidade também me trariam, e eu seria o guardião de sua dor. Meu poder seria o seu poder. Minha força também. Mas você está morto por dentro, é frio e está fora de meu alcance! É como se eu não estivesse aqui, a seu lado. E sem estar com você, tenho a terrível sensação de que simplesmente não existo. E você é tão insensível e distante quanto estas estranhas pinturas modernas de linhas e formas brutas que não posso amar ou compreender, tão enigmático quanto as esculturas mecânicas atuais, que não têm forma humana. Tremo quando estou próximo de você. Olho em seus olhos e não encontro meu reflexo... P. 304


Filme: Entrevista com o Vampiro
Direção: Neil Jordan
Ano: 1994
Origem: Estados Unidos








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